A divulgação de certos casos judiciários tem de supor, sempre, a violação do segredo de justiça, milhares de vezes registada, por exemplo no processo Casa Pia, ou é possível um outro tipo de relação entre a justiça e a comunicação social?
Maria José Morgado - Muito concretamente, se houve milhares de violações de segredo de justiça em determinado caso ultramediatizado ou até patologicamente mediatizado, eu não gostaria de seguir por aí, nem criminalizar o debate, sob pena de perdermos completamente a importância das coisas, sua natureza, e do significado.
Estamos preparados para assumir um tipo de relacionamento mais transparente?
Maria José Morgado - Nunca estamos suficientemente preparados. As mudanças no interior das magistraturas são sempre mais difíceis porque estamos a lidar com gente que é formada para aplicar a lei e que, evidentemente, pode ter um determinado tipo de formação que cria dificuldades à mudança. Começando por mim própria. Sinto às vezes essas dificuldades, como é evidente…
É possível haver transparência sem perda de autoridade?
Maria José Morgado - Aparentemente, quando a comunicação social entra em funcionamento, nos nossos dias, parece que transparência e autoridade são coisas antitéticas - no sentido de que ao se ser transparente se perde a autoridade. É necessário, de facto, haver transparência e haver autoridade.
Como?
Não sei… não quero ser pretensiosa e dizer que há receitas acabadas. Há experiências comparadas…
Ricardo Cardoso - É evidente que a comunicação social tem um papel fundamental na tradução e publicidade das audiências. É obrigatória, e está constitucionalmente consagrada, ao contrário do que se passava antes do 25 de Abril, em que havia julgamentos à porta fechada. A regra é a publicidade e o esclarecimento das decisões… Mas, para o bom esclarecimento, a própria decisão deve conter todos os elementos necessários a poder ser interpretada pelo mais vulgar dos cidadãos… Todas as decisões são discutíveis em termos públicos.
Essa "tradução" tem sido bem feita?
Ricardo Cardoso - Temos assistido a três níveis diferentes de linguagem. Umas vezes, a decisão é meramente transposta para os media, e chega assim aos cidadãos. Outras vezes, já tem uma interpretação opinativa de quem divulga. Ou, mais grave ainda, a divulgação e tradução são feitas pelos próprios intervenientes no processo. Este último nível é muito frequente, mas é eticamente reprovável. Os intervenientes no processo não devem pronunciar-se sobre o mesmo....
Quer referir algum caso concreto sobre esse terceiro nível?
Ricardo Cardoso - Não me lembro agora de nenhum… mas devem conhecer alguns… (risos).
Mas o debate público é positivo...
Ricardo Cardoso - O debate público é positivo, mas a violação da ética por parte dos intervenientes no processo não é positiva. É como se os senhores jornalistas começassem a discutir sobre quem são as fontes uns dos outros.
Maria José Morgado - A comunicação social é o intermediário entre o tribunal e as pessoas… essa é que é a grande questão. Mas a percepção da justiça na opinião pública, feita através dos jornalistas, é, às vezes, ligeiramente desfasada da realidade da justiça...
Maria José Morgado - Muito concretamente, se houve milhares de violações de segredo de justiça em determinado caso ultramediatizado ou até patologicamente mediatizado, eu não gostaria de seguir por aí, nem criminalizar o debate, sob pena de perdermos completamente a importância das coisas, sua natureza, e do significado.
Estamos preparados para assumir um tipo de relacionamento mais transparente?
Maria José Morgado - Nunca estamos suficientemente preparados. As mudanças no interior das magistraturas são sempre mais difíceis porque estamos a lidar com gente que é formada para aplicar a lei e que, evidentemente, pode ter um determinado tipo de formação que cria dificuldades à mudança. Começando por mim própria. Sinto às vezes essas dificuldades, como é evidente…
É possível haver transparência sem perda de autoridade?
Maria José Morgado - Aparentemente, quando a comunicação social entra em funcionamento, nos nossos dias, parece que transparência e autoridade são coisas antitéticas - no sentido de que ao se ser transparente se perde a autoridade. É necessário, de facto, haver transparência e haver autoridade.
Como?
Não sei… não quero ser pretensiosa e dizer que há receitas acabadas. Há experiências comparadas…
Ricardo Cardoso - É evidente que a comunicação social tem um papel fundamental na tradução e publicidade das audiências. É obrigatória, e está constitucionalmente consagrada, ao contrário do que se passava antes do 25 de Abril, em que havia julgamentos à porta fechada. A regra é a publicidade e o esclarecimento das decisões… Mas, para o bom esclarecimento, a própria decisão deve conter todos os elementos necessários a poder ser interpretada pelo mais vulgar dos cidadãos… Todas as decisões são discutíveis em termos públicos.
Essa "tradução" tem sido bem feita?
Ricardo Cardoso - Temos assistido a três níveis diferentes de linguagem. Umas vezes, a decisão é meramente transposta para os media, e chega assim aos cidadãos. Outras vezes, já tem uma interpretação opinativa de quem divulga. Ou, mais grave ainda, a divulgação e tradução são feitas pelos próprios intervenientes no processo. Este último nível é muito frequente, mas é eticamente reprovável. Os intervenientes no processo não devem pronunciar-se sobre o mesmo....
Quer referir algum caso concreto sobre esse terceiro nível?
Ricardo Cardoso - Não me lembro agora de nenhum… mas devem conhecer alguns… (risos).
Mas o debate público é positivo...
Ricardo Cardoso - O debate público é positivo, mas a violação da ética por parte dos intervenientes no processo não é positiva. É como se os senhores jornalistas começassem a discutir sobre quem são as fontes uns dos outros.
Maria José Morgado - A comunicação social é o intermediário entre o tribunal e as pessoas… essa é que é a grande questão. Mas a percepção da justiça na opinião pública, feita através dos jornalistas, é, às vezes, ligeiramente desfasada da realidade da justiça...
Fonte: Diário de Notícias
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